Monday 5 April 2010

O Eclipse

Eu nunca quis ser figurinista.

Das minhas menos remotas memórias da infância, posso citar de cara 3.
Vestir os primos em todas festas famíliares pra alguma apresentação (tudo mera desculpa pra uma incursão ao maravilhoso mundo do closet de minha avó). Passar madrugadas a fio assistindo escondida filmes preto e branco, hipnotizada por Davis, Hayworth, Bergman e Hepburn(s) e finalmente, minha revolta ao encontrar uma amiga com o brinco igual ao meu numa festa de aniversário. No caso ela era a aniversariante e o brinco horrendo, com a cara da xuxa em tamanho colossal e até cabelo fake. Mas isso eram os anos 80 e depois que eles ficaram vintage a gente perdoou.

Enfim, apesar do histórico "clichê" eu nunca quis ser figurinista.
Pelo menos não que eu soubesse.
Precisei me formar em publicidade e largar uma faculdade de estilismo no meio, para entender que eu não queria comunicar ou desenhar roupas, ou pelo menos não só isso. Queria comunicar através da roupa.
Ah sim, aí eu virei figurinista. E lá se vão 7 anos.

No meu primeiro post aqui (oi, prazer, Letícia Gicovate!), quero falar sobre um dos meus figurinos preferidos ever, entre os mais mais, dos que eu quase tiro o som do filme pra ver melhor.

O Eclipse (1962)



O figurino é a arte de contar uma história, traduzir um personagem em roupa. É pensar em como aquela pessoa inventada se expressa, se mostra ao mundo, no caso aos olhos do espectador. Através do figurino fazemos a primeira leitura, o primeiro "julgamento". Sim, claro, julgamos pela aparência! (e sempre cabe nessa hora citar Oscar Wilde com "só os tolos não julgam pela superfície", ou algo parecido). Afinal, mesmo em silêncio, lêmos pelo figurino referências, preferências, idiossincrasias, status e até um ou outro mistério sobre o personagem. Alguns são tão emblemáticos que falam mais que qualquer diálogo do filme.

O que dizer então sobre o figurino de um filme da "trilogia da incomunicabilidade" de Michelangelo Antonioni?

Se como dizem, os amantes de filmes italianos são divididos em dois campos: Fellini versus Antonioni, eu sei bem por quem eu brigo. Sou uma apaixonada pela obra do cineasta-esteta, conhecido por contar histórias através do não dito, de silêncios inoportunos e perturbadores. Talvez mais um grande construtor de imagens que um grande contador de histórias, Antonioni envolvia questões existências em cenas pictórias, lindas.



O Eclipse é um filme pautado na solidão a dois entre os belíssimos, Alain Delon e Monica Vitti (Piero e Vittoria).



Assim como a fotografia, cheia de perspectivas lineares, detalhes geométricos e formas arquitetônicas, os figurinos de Bice Brichetto e Gitt Magrini, seguem a simplicidade modernista, clássica do início dos anos 60. A falta de cor traduz brilhantemente uma certa falta de perspectiva, um certo tédio, uma certa sensação de vazio que toma o expectador ao longo da narrativa. Ou não narrativa.


Bela, bourgeouis e perdida, Vittoria dá ódio de tanta elegância. Seu figurino, minimalista, sóbrio, de linhas retas e simples, contrasta belamente com sua complexidade, seu caos interno. E bem, como disse, é chique, chique, chique e charmoso de doer.


Piero por sua vez, sempre impecável é muito vanguarda, apresentando 20 anos antes a figura racional, enérgica e ambiciosa dos "yuppies". Só que com a doçura no olhar de Delon, ai ai.


"Gostaria de não amá-lo ou amá-lo muito melhor"

Este não é o meu filme favorito de Antonioni, morro toda vez que assisto A noite, o primeiro da trilogia. Isso sem mencionar Blow Up... (ok, não tem como falar de Atonioni + moda sem mencionar Blow Up!)
Mas o figurino de O eclipse, representa pra mim a nova "nova" elegância. Simples, minimalista, apoiada em linhas certas e precisas, sem excessos, mas sem perder o glamour jamais (alguém aí pensou em Stella McCartney?!). E bem, além de tudo a mulher fica com cara de "desculpa, eu não preciso de muito pra ser chique."
E bem, quer saber? Não precisa mesmo.

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